terça-feira, 7 de outubro de 2014

A felicidade se promete?

A procura pelo religioso talvez seja motivada por um desejo incontido de felicidade.
Das muitas possíveis formas de entendimento do fenômeno religioso, a vontade de integração com o invisível, com a natureza encantada por deuses amorosos ou perversos, com as fantasias pastoris de um paraíso terreal, das alegorias transcendentes do universo humano, sem sofrimentos e necessidades, enfim, da vida eterna, jovial e saudável, parecem todas elas afirmar o sentimento de projeção que a vida feliz sugere. Mesmo que o impulso de felicidade possa surgir como algo quase impossível de plena realização. A disciplina moral e física exigida pela ascese, a renúncia desejada à vida mundana, a construção do artifício teológico como base para a compreensão do que muitas vezes é mesmo inexplicável, tudo isso contribui para a complexa pretensão de felicidade.

Notadamente as grandes religiões monoteístas – que de uma forma ou de outra acabaram por afetar todo o argumento sobre o assunto – ensinam que a felicidade é um projeto transcendente, para além da vida que conhecemos. A experiência religiosa é assim um duro conjunto de regras morais, que ajustam o valor e a conduta a partir da ideia pouco precisa da existência após a morte e do exemplo sempre difícil de alcançar de seus avatares.

Então, o ser feliz para os homens é o desejo e a projeção de felicidade em outra vida pretendida; é também o cumprimento muitas vezes sacrificioso de procedimentos que o fiel deve obedecer em nome da redenção final, da elevação dos justos e da queda dos danados. A felicidade, vista através das grossas colunas de templos antigos, exige empenho e regra.

Mas ser feliz não deveria ser tão difícil. A promessa de felicidade parece ocupar o discurso central de religiões ao longo da história, mesmo que este não seja o objeto confessado de seu interesse. Então por que se justificariam os pesados sacrifícios, frequentemente contraditórios de uma vida feliz?

O estudo que está em andamento pretende investigar como em algumas religiões tradicionais, politeístas, animistas e com forte amparo no recurso mitológico, a ideia de felicidade é percebida. Em particular, o tratamento de caso da religião yorubá permite bom exemplo desta relação do homem com o fenômeno religioso, sem qualquer concessão à tristeza ou à frustração dos desejos mundanos da felicidade.

Rogério Athayde (Escritor)

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